Coluna Vitor Vogas
Suplente pede mandato de Luiz Emanuel na Justiça por infidelidade partidária
Em novembro, Executiva Estadual do Cidadania liberou desfiliação do vereador de Vitória e abriu mão de lutar pelo mandato, mas Leonil Dias não deixou barato e entrou com ação de cassação na Justiça Eleitoral

Leonil Dias e Luiz Emanuel. Fotos: Facebook e Câmara de Vitória
O ex-vereador de Vitória Leonil Dias (Cidadania) pediu à Justiça Eleitoral o afastamento liminar e a cassação do mandato do vereador Luiz Emanuel Zouain (sem partido). Suplente do Cidadania na Câmara de Vitória, Leonil protocolou ação de perda de mandato contra Luiz Emanuel por infidelidade partidária, nesta segunda-feira (23).
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Se a Justiça Eleitoral der ganho de causa a Leonil, é ele quem assumirá a vaga de Luiz Emanuel na Câmara. O processo tramita na 1ª Zona Eleitoral de Vitória e está sob segredo de Justiça, mas a coluna teve o aos autos.
Na última eleição municipal, realizada em 2020, o Cidadania elegeu três vereadores: Denninho Silva, Mauricio Leite e Luiz Emanuel, reeleito naquele pleito com 3.105 votos. Já Leonil não conseguiu se reeleger. Com 1.810 votos, ficou na 2ª suplência do partido.
O 1º suplente do Cidadania é Vinícius Simões, prestes a assumir uma cadeira na Câmara no lugar de Denninho Silva (hoje filiado ao União Brasil). Eleito deputado estadual, Denninho tomará posse na Assembleia Legislativa no dia 1º de fevereiro. Nessa data, portanto, Leonil ará à condição de 1º suplente do Cidadania no Legislativo de Vitória. Mesmo ainda sendo o 2º suplente, ele alega ter legitimidade para reclamar o mandato hoje ocupado por Luiz Emanuel.
No Espírito Santo, o Cidadania é presidido pelo deputado estadual Fabrício Gandini. No dia 29 de novembro do ano ado, em reunião da Executiva Estadual do Cidadania, Luiz Emanuel requereu e recebeu da direção a anuência para se desfiliar do partido. Isso equivale a uma autorização formal para o parlamentar sair da sigla com garantias plenas de que os dirigentes partidários não reivindicarão o mandato à Justiça Eleitoral.
Com efeito, desde a data da desfiliação, a direção do Cidadania teve 30 dias para reclamar o mandato do vereador junto à Justiça Eleitoral – partindo da premissa de que os mandatos de vereadores, deputados estaduais e federais não pertencem ao candidato eleito, mas ao partido pelo qual ele se elegeu. Porém, transcorrido esse prazo, a direção do partido nada fez, respeitando o acordo de cavaleiros firmado com Luiz Emanuel.
Aqui cabe um parêntese: a Executiva Estadual do Cidadania buscou a solução amigável com Luiz Emanuel justamente porque preferia vê-lo fora do partido o quanto antes. Nascido no início dos anos 1990 do PCB (Partido Comunista Brasileiro), o Cidadania (antigo Partido Popular Socialista – PPS) é uma legenda de centro-esquerda.
Na eleição presidencial do ano ado, a federação formada entre Cidadania e PSDB apoiou Simone Tebet (MDB) no 1º turno. Logo no início do 2º turno, a direção nacional do Cidadania declarou apoio a Lula (PT) contra Jair Bolsonaro (PL).
Por sua vez, mesmo eleito vereador pelo Cidadania em 2020, Luiz Emanuel se estabeleceu ao longo do atual mandato como um bolsonarista ferrenho e um defensor incondicional do ex-presidente da República no plenário da Câmara. Nos anos anteriores, o vereador (com origens da esquerda e no PT) já vinha manifestando posições muito mais à direita que as do próprio partido. Assim, sua presença no Cidadania vinha gerando constrangimento para as duas partes.
“A carta de alforria” dada pela Executiva Estadual foi a solução encontrada por Gandini e os demais dirigentes porque, do contrário, Luiz Emanuel teria permanecido no Cidadania pelo menos até a próxima janela de trocas partidárias liberadas para os atuais vereadores, a ser aberta somente em março de 2024.
Sem a liberação formal por parte da Executiva Estadual, Luiz Emanuel não assumiria o risco de sair do partido por conta própria, sabendo que com isso daria brecha para a direção reclamar o mandato na Justiça Eleitoral. E assim o desconforto mútuo teria perdurado até o ano que vem.
Luiz Emanuel ficou muito satisfeito com o arranjo… O Cidadania ficou muito satisfeito com o arranjo… Mas Leonil ficou inconformado com a acomodação encontrada entre as partes. E decidiu recorrer à Justiça, movendo a ação de infidelidade partidária contra Luiz Emanuel – diga-se de agem, também contra o Cidadania, representado por Gandini e também incluído no polo ivo pelos autores da ação – assinada por Leonil e pelos advogados Marcos Vinicius de Lima Bezerra e Karla Gabriela Sipolati Bezerra.
Como reza a legislação sobre o tema, quando o partido político não formula o pedido dentro do prazo de 30 dias desde a desfiliação, o Ministério Público Eleitoral ou quem tenha interesse jurídico pode fazê-lo, em nome próprio, nos 30 dias seguintes.
A priori, o 1º suplente do Cidadania, Vinícius Simões, teria “interesse jurídico” na cadeira de Luiz Emanuel, mas, como lembrado acima, já está prestes a assumir outra, a ser deixada por Denninho Silva. Assim, Simões também não tomou nenhuma medida legal. Leonil, sim.
O que alega Leonil
Na ação, Leonil pede que Luiz Emanuel seja imediatamente afastado do cargo e que, no julgamento do mérito, seja condenado à perda do mandato.
O ex-vereador alega que a saída de Luiz Emanuel do Cidadania não se encaixa em nenhuma das “justas causas” para desfiliação de vereadores e deputados previstas na legislação eleitoral: incorporação ou fusão do partido; criação de novo partido; mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário; grave discriminação pessoal.
“Nenhuma das causas acima se fizeram presentes [para] que motivassem o 1º requerido [Luiz Emanuel] a conseguir do partido Cidadania sua liberação”, sustentam os advogados de Leonil.
Chamando Luiz Emanuel de “traidor dos princípios do partido”, Leonil argumenta que, na verdade, foi o vereador quem se desviou do programa do Cidadania, por seus posicionamentos e discursos em plenário:
“Ao contrário, muito antes de requerer a sua liberação junto ao partido, [Luiz Emanuel] mudou radicalmente sua linha de atuação política, […] ando a defender pautas de viés de direita e, com isto, infringindo de morte o juramento de fidelidade partidária que fez, eis que o Partido Cidadania possui viés de centro-esquerda”.
No mesmo sentido, também lê-se na peça:
“A conduta de infidelidade partidária, pelo Sr. Luiz Emanuel, começa desde a sua eleição em 2020 e, ao longo da legislatura, materializa-se quando o mesmo, em seus inúmeros discursos na Câmara Municipal de Vitória e em suas redes sociais, ataca, inclusive, os candidatos que são aliados políticos e coligados do Partido Cidadania, em total desrespeito às normas e ao Estatuto do Partido”.
Para ilustrar o argumento, a ação inclui foto publicada por Luiz Emanuel ao lado da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli e material da última campanha do vereador a deputado estadual, em 2022, em montagem com foto de Jair Bolsonaro.
“São inúmeras as provas de que [Luiz Emanuel] praticou infidelidade partidária muito antes de pedir sua liberação, o que por si já seria motivo mais que suficiente para o partido [do] Requerido ter agido, quando não agiu”, concluem os advogados.
“Inércia inexplicável”
A propósito, o que também salta da peça é o inconformismo de Leonil com o que seus advogados definem como “inexplicável inércia” e “omissão deliberada” por parte do Cidadania, ao não propor ação de perda de mandato em face de Luiz Emanuel, “em evidente desrespeito à legislação eleitoral, à vontade popular expressa de forma soberana nas urnas e ao próprio Estado Democrático de Direito”.
Para os autores da ação, essa inércia foi motivada “quiçá por interesses pouco republicanos”. Segundo eles, “o justo motivo [para a desfiliação do vereador] foi fabricado pelo partido Cidadania”: “É surpreendente a fabricação de uma justa causa fictícia com a consequente inércia do partido”.
Leonil ainda argumenta que não caberia à Executiva Estadual do Cidadania liberar Luiz Emanuel para se desfiliar do partido, renunciando a pleitear o mandato. A questão, alega, só poderia ter sido deliberada pelo Diretório Estadual, máximo órgão decisório da agremiação no Espírito Santo, durante congresso municipal ou estadual.
Luiz Emanuel: “Litigância de má-fé”
Procurado pela coluna, Leonil não atendeu às ligações nem respondeu às mensagens.
Luiz Emanuel, sim. E também não deixou barato. Ele afirma que, se for notificado da ação de Leonil, alegará em juízo que o suplente está praticando litigância de má-fé, pois sabe que ele obteve da Executiva Estadual do Cidadania a anuência para se desfiliar sem risco de perda do mandato:
“A anuência é uma decisão da principal instância partidária, a Executiva Estadual, uma medida legal prevista na Constituição Federal em seu Artigo 17, parágrafo 6º. Foi concedida a mim, da mesma forma como foi concedida ao vereador Denninho, agora deputado estadual”, relembra o vereador.
“Se for notificado em face da ação, vamos em juízo alegar litigância de má-fé por parte do ex-vereador e pedir o arquivamento por total improcedência, além do pagamento de honorários por ‘omitir’ na ação movida que eu possuo a anuência. Omissão e má-fé!”, completa.
Por sua vez, Gandini enviou a seguinte nota:
“Respeitamos muito o Leonil, foi um ótimo vereador e tem toda a legitimidade para questionar a ação do parlamentar que de fato mudou sua posição política e pediu para sair do partido. O partido vai colaborar com a Justiça no que for demandado.”
Errata
Inicialmente, eu havia publicado com erro que o Cidadania nasceu do PCdoB. Na verdade, como corrigido no texto, o partido tem origens no PCB.
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